A importância de compreender a predominância metabólica durante o exercício

Um erro bastante comum é pensar que dependendo da intensidade e duração do exercício uma via metabólica vai ser ativada e outra será desligada

Por Eduardo Figueiredo

Entender o metabolismo é a chave para entender a vida, e isso tem sido um assunto de fascínio entre cientistas por mais de 150 anos. Nomes como Hans Krebs, Otto Warburg, A. V. Hill entre outros, decifraram processos químicos e moleculares que hoje em dia estão nas páginas dos principais livros de fisiologia. Metabolismo é derivado da palavra grega metabolē que significa ‘mudar’ e compreende o total de todas as reações químicas que ocorrem na célula e que são essenciais para a vida.

Para entendermos de forma simples e básica, pense que todas essas reações vão acontecer para sintetizar ou degradar macromoléculas complexas, daí o termo ‘anabolismo e catabolismo’, sendo o catabolismo a degradação de macromoléculas complexas em moléculas mais simples e o anabolismo a via que gera macromoléculas complexas como proteínas, lipídios, polissacarídeos (açúcar) e ácidos nucléicos.

Mas, o que isso quer dizer? Pense dessa forma, o seu metabolismo é como o motor gerador de energia do seu corpo. Pense em todas as funções que você executa durante o seu dia, desde o levantar da cama pela manhã até ir ao trabalho, e claro, se exercitar, todas essas atividades tem algo em comum para as nossas células do corpo, todas elas precisarão de energia em forma de uma molécula, ATP, para executar suas funções tecido específicas. Lembre-se, a energia será necessária para todas as funções, na contração muscular, no transporte de substratos e na própria biossíntese de macromoléculas complexas como foi dito anteriormente.

Até aqui entendemos que nós produzimos energia 24 horas por dia durante todo o ciclo de nossa vida, mas como seu corpo controla isso? E principalmente, para os leitores atletas, como essa demanda energética ocorre durante uma atividade, seja uma prova longa (corrida, triathlon, ciclismo) ou mesmo em situações basais (repouso). Vamos por partes, o metabolismo é organizado em vias metabólicas distintas para maximizar a captura de energia ou minimizar a sua utilização (minimizar não significa parar). No catabolismo, as vias metabólicas são organizadas de tal forma para liberação de energia pela síntese de ATP, já no anabolismo as vias metabólicas utilizam a energia em forma de ATP para realizar trabalho, como a síntese de biomoléculas. O mais incrível é que isso está ocorrendo agora, neste exato momento, centenas de reações metabólicas podem estar acontecendo enquanto eu escrevo esse texto e, enquanto vocês leem esse texto. O que vai diferenciar o quanto de energia será necessário para executar uma leitura ou mesmo uma prova de triathlon, é a demanda energética exigida pela atividade.

Tanto o carboidrato quanto a gordura são reconhecidamente substratos importantes para a produção de energia no músculo, e o mais importante, até em repouso tanto o carboidrato quanto a gordura são oxidados para fornecer energia necessária para os processos metabólicos basais no músculo, mesmo sobre uma demanda metabólica inalterada, as mudanças no combustível energéticos são em grande parte impulsionadas pela disponibilidade de substratos, ou seja, a disponibilidade metabólica é a capacidade de utilizar todos os combustíveis energéticos no músculo para suportar as demandas específicas do exercício. Basicamente, a contribuição relativa das vias geradoras de ATP para o fornecimento de energia durante o exercício é determinada principalmente pela intensidade e duração do exercício. Outros fatores que influenciarão o metabolismo do exercício incluem status de treinamento, dieta, sexo, idade e condições ambientais.

Um erro bastante comum é pensar que dependendo da intensidade e duração do exercício uma via metabólica vai ser ativada e outra será desligada. Isso não acontece! Um bom exemplo disso é, quando um exercício de curta duração muito intenso começa, todas as vias associadas ao fornecimento de ATP, tanto anaeróbico quanto aeróbico são ativados simultaneamente, o que ocorrerá é que as taxas de fornecimento de energia das fontes anaeróbicas (Glicólise) serão mais rápidas do que as das vias aeróbicas (metabolismo oxidativo mitocondrial). Essa condição ficou conhecida como ‘predominância metabólica’, aonde haverá maior predominância no fornecimento energético de uma via em relação a outra dependendo da demanda.

Durante provas que duram horas, o metabolismo oxidativo de carboidratos e gorduras fornece quase todo o ATP para a contração do músculo esquelético. Mesmo durante eventos de maratona e triatlo com duração acima de 2 horas, há uma dependência primária da oxidação de carboidratos. Um ponto importante e que ainda vejo muitos atletas pecarem é na alimentação durante a prova. Não cabe a mim falar sobre nutrição, mas posso dizer que durante uma prova longa não é incomum a produção de glicose do fígado ficar abaixo da captação de glicose muscular, resultando em hipoglicemia, um problema que pode ser solucionado com ingestão de carboidratos durante a prova, uma questão que pode ser muito bem resolvida junto ao seu nutricionista, e vale dizer sempre que isso é um fator extremamente individual.

Quando observamos a produção de energia durante o exercício de resistência em intensidades abaixo de 100% VO2 max, a geração de ATP aeróbico domina. Nessa situação, há uma disponibilidade de tempo para mobilizar substratos de gordura e fontes de carboidratos do músculo, bem como do tecido adiposo e do fígado.

Outra questão relevante é a influência dos sexos no metabolismo, parecendo haver algumas diferenças no metabolismo durante o exercício. Recentes evidências demonstraram que há uma porcentagem maior na utilização de combustível derivado da gordura em mulheres que se exercitam na mesma intensidade submáxima, e esse efeito poderia estar associado aos níveis circulantes de estrogênio. As mulheres têm maior proporção de fibras do tipo I, menor capacidade máxima de enzimas glicolíticas e maior dependência de triglicerídeos intramusculares durante o exercício do que os homens, efeitos que podem estar relacionados às maiores concentrações de triglicerídeos intramusculares nas fibras do tipo I. Além disso, a suplementação com estrogênio em homens mostrou diminuir a oxidação de carboidratos e aumentar a oxidação de gordura durante exercícios de resistência, sugerindo que as mulheres podem ser mais aptas ao exercício de resistência do que os homens.

Apesar dos avanços no entendimento do metabolismo durante o exercício, muitas perguntas ainda esperam respostas com relação aos processos que regulam esses mecanismos. Atualmente, evidências ilustram a colaboração de outros processos fisiológicos e moleculares na manutenção das vias metabólicas. Mas isso, eu conto no próximo texto.

Prof. Eduardo Figueiredo
Graduado em Educação Física
Especialista em Fisiologia do exercício
Mestrando em Oncologia – PPGO / CPQ – INCA
Professor de ciclismo da equipe Cordella team
Professor da clínica de reabilitação cardíaca MEDSPORT
Personal trainer
@prof.edu_figueiredo

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