Qual triatleta nunca saiu da água e, ao subir na bike, teve a sensação ruim que por causa do vento o dia ia ser mais longo do que o imaginado? Quem nunca olhou com temor para alguma bandeirinha do percurso e a viu totalmente esticada… na direção contrária a que está pedalando? É, todos nós já passamos por isto.
Se não bastasse tornar a etapa de ciclismo mais lenta, ainda prejudica a corrida, pois as pernas saem “moídas” devido ao esforço sobre os pedais. Posto isto, solicitamos dicas de atletas brasileiros conhecidos pelo talento em cima da bicicleta. Observe que não existe uma “receita de bolo”. O que é bom para um, pode não ser bom para o outro. O importante é saber identificar o que mais é eficiente para você. Vamos a elas:
Alexandre Ribeiro
Estude o percurso e o local da prova. “Já fui muitas vezes ao Havaí, para o Ironman ou para o Ultraman, e a escolha certa das rodas em locais como este é essencial. Não precisa gastar todas as suas economias em rodas superaerodinâmicas, se o local da prova não permite utilizá-las. Tente sempre obter informações pré-competição: Em qual intensidade o vento é esperado, que horas ele costuma entrar e em que direções. Nem sempre dá para acertar 100%, mas dá para se ter uma boa idéia do que vem pela frente.
Fique atento à sua posição sobre a bike. Saiba que “de pernas tortas”, o ato de pedalar é uma desgraça aerodinâmica! Se for um dia quente, resista à tentação para abrir a sua camisa.”
Ribeiro é hexacampeão mundial do Ultraman e conhecido pela sua habilidade de vencer o vento sobre uma bicicleta.
Igor Amorelli
“Eu aconselho fazer alguns treinos de força (big gear, por exemplo) no ciclismo, para quando pegar vento contra, por mais difícil que seja, estar um pouco mais preparado. Além disso, utilizar roupas justas também ajudam. Quando pedalo contra o vento, procuro me mexer o menos possível. Na maioria das vezes pedalo no clip, mas com cuidado, porque não temos o mesmo controle do que segurando nos manetes.
Em competições, pode-se usar vários equipamentos para ajudar na aerodinâmica, como capacete, roda com perfil alto, roda fechada. Mas quando se pega muito vento lateral, alguns desses equipamentos podem não ser
indicados. Pedalar no clip com vento lateral também pode ser muito difícil… Em provas com vácuo você pode pedalar atrás, mas com muita atenção. Quando o vento está lateral você pode se posicionar atrás e um pouco do lado, dependendo do vento, mas novamente com muito cuidado.”
Igor é triatleta profissional e vencedor do Ironman Brasil Florianópolis 2014.
Roberto Lemos
“Para mim não existe nada além do trivial que possa ser feito para vencer o vento. No caso do triathlon sem vácuo: Posição aero no vento contra e segurar firme no guidão quando houver rajadas. Em provas com vácuo, o ideal é acertar o alinhamento de acordo com a direção do vento, desta forma será possível obter o máximo de vantagem do vácuo. Por exemplo, se o vento for contra, mas vindo um pouco da esquerda, os ciclistas que estão no vácuo devem ficar um pouco à direita do ciclista que está à frente.
Na minha opinião, muitos atletas erram ao pensar no vento como algo muito ruim, chegam a evitar dias ventosos para treinar. Eles esquecem que quando venta contra em uma prova, o vento é para todos. Desta forma a maior dificuldade é mental, pois estes atletas acabam se desconcentrando e errando no ritmo a ser adotado. A forma correta de vencer o vento é fazer um ajuste na relação, de tal forma que você possa manter o mesmo nível de esforço de quando estava sem vento. Para os atletas que têm medidores de potência fica mais fácil. A dica é não se concentrar na velocidade e, sim, na cadência e na força aplicada no pedal, além da posição mais aerodinâmica. O atleta que consegue manter a concentração durante uma prova com vento contra acaba levando vantagem sobre outros ciclistas, ao ponto de desejaram um dia ventoso na prova. Isto é similar ao que acontece em subidas, com a diferença no posicionamento. Em provas longas, condições favoráveis nivelam os atletas por baixo.”
Lemos é ex-triatleta profissional e técnico da equipe Ironmind, de Santa Catarina.
Marcus Ornellas
“Sempre que vou para uma competição, principalmente as internacionais, procuro estudar a altimetria da prova e as condições climáticas. Procuro escolher o par de rodas ideal para cada condição específica e, por isso, há muito tempo prefiro ter uma roda dianteira de perfil mais baixo, pois, na minha opinião, as rodas dianteiras de perfil alto não me oferecem muita segurança nas descidas e são extremamente instáveis com vento lateral, principalmente se o atleta for de baixo peso.
Provas como St Croix , Havaí, Lanzarote e Fortaleza, têm percursos onde não é aconselhável competir de roda fechada – inclusive é proibido no Havaí. Eu, quando enfrento situações de vento contra, procuro uma cadência menor, pedalando realmente pesado mas com eficiência, lutando contra o vento. Prefiro “ganhar tempo” contra o vento e me recuperar com o vento a favor. Acredito que cadências altas elevam muito a minha frequência cardíaca, o que podem me gerar uma alta produção de ácido lático. Um verdadeiro veneno para minhas pernas!
Minha sugestão para enfrentar os ventos laterais é de mover-se um pouco mais à frente no selim, apoiando-se mais à frente no clip, sem deixar de pedalar em momento algum, mesmo quando houver essas rajadas laterais, pois normalmente quando elas acontecem, paramos de pedalar e exatamente por isso desestabilizamos a bike.”
Marcus Ornellas é reconhecido como um dos maiores ciclistas da história do triathlon nacional
Marcio May
“Nas provas de contrarrelógio o fundamental é a concentração para não desperdiçar nem um segundo. A posição aerodinâmica da bicicleta de contrarrelógio deve ser ajustada através de um bike fit, para o ciclista estar o mais aerodinâmico possível e ao mesmo tempo confortável.
Quando for pedalar no vento contra, deve-se usar o câmbio, ajustando a rotação das pernas. Não deixe o giro cair, pois no vento contra, quando você deixa cair o ritmo em uma rajada de vento e está em marcha pesada, fica mais difícil de retornar a velocidade, perdendo-se muito tempo. O uso de capacete aerodinâmico ajuda a cortar o vento, porém ele é projetado para anular o refluxo do vento atrás da cabeça, desde que o atleta fique olhando para frente, quando o atleta abaixa a cabeça, o bico do capacete fica para o alto, perdendo aerodinâmica, portando mantenha a cabeça olhando para frente, assim o capacete faz o efeito desejado.
Atente-se ao uso da roda fechada no contrarrelógio. Ela ajuda, porém se o vento for muito forte lateralmente, pode ser melhor utilizar uma roda de carbono com perfil alto, mas não fechado. No mais, é concentração total e quando achar que não vai aguentar, pense que o adversário está pensando o mesmo. Quem suportar mais, vence!”
Marcio foi atleta olímpico e um dos maiores ciclistas do Brasil, e considerado por muitos como o melhor atleta de contrarrelógio de nosso país.
Para “meditar”
Para finalizar, após estas dicas eficientes de grandes treinadores e atletas, a frase que é uma verdadeira pérola quando o assunto é vento, proferida pela triatleta Liege Carolina de Souza: “O pessimista reclama do vento, o otimista acredita que ele vai virar, e o realista vai para o cilp”. Perfeita…