Entrevista: Frank Silvestrin

Conte-nos o seu início no Triathlon. Quais foram seus técnicos e a sua escola no esporte?
Eu começo a me dedicar ao triathlon em 1998, mas só fui participar de uma competição (duathlon) em 1999. Entretanto, eu já praticava esportes desde criança, por estímulo em casa. Minha mãe quis que eu e meus irmãos aprendêssemos a nadar. Eu odiava nadar, porque não era bom naquilo. Sempre fui competitivo. Sou apaixonado por bikes, tive várias desde moleque, e posso lembrar de cada uma até hoje. Cheguei a treinar futebol também. Acho que o futebol tem bastante responsabilidade no meu repertório motor. Jogava como lateral esquerdo, então corria bastante!  Quando voltei a nadar na adolescência, por sorte o meu professor era o Roberto Lemos, uma referência no triathlon até hoje. Então eu passei a ver e a conviver com triatletas pioneiros daqui de Porto Alegre. Não demorou pra eu querer ser como eles. Ganhar o Estadual de Triathlon foi o meu primeiro objetivo. Até que fui treinar com o treinador do Roberto, o Wilson Mattos. Os dois são duas das maiores referências que tenho nesse esporte. Me ensinaram muito e são responsáveis pela minha chegada à profissionalização e aos resultados que conquistei. Comecei no esporte tendo como referência atletas locais que foram por muito tempo meus ídolos. Eu queria ganhar deles. Éramos um grupo que competia de forma muito saudável, porque havia (e há até hoje) muita amizade, parceria e camaradagem mesmo.

Como foi seu primeiro Ironman?
Resultados melhores não caem do céu. São fruto de determinação e paciência, degrau por degrau. Minha trajetória na longa distância deve-se muito à disciplina e ao trabalho feito nas provas curtas. Foram dez anos em provas curtas e olímpicas. Mesmo enquanto me dedicava somente a elas, sempre coloquei um Meio Ironman na minha preparação, no meu período de base, a partir do meu quinto ano no triathlon, Se você pegar minha trajetória em Ironman, também foi degrau por degrau. O meu primeiro foi o de Cozumel, México, em 2011, que completei em 9h32min e cheguei em 24º lugar. Escolhi uma prova dura, prometendo calor, vento e longe daqui, para fazer sem pressão. Cheguei sem bike também… Foi extraviada pela companhia aérea! Tive de alugar outra e sofri demais no pedal. Fiz uma natação incrível, saí da água com os líderes, mas sem a minha própria bike o Plano A tinha naufragado. Apesar do azarão, terminei a prova faceiro, porque sabia que tinha dado o meu melhor.

Quais suas experiências como atleta e técnico?
Eu consolidei minha carreira com esse 3º lugar no Ironman Brasil, com a vaga em Kona, 20 anos depois de começar no esporte. Vinte! Alguns dirão que é muito tempo para chegar “lá”. Mas eu não vejo assim. Eu só posso agradecer. Primeiro porque nesses 20 anos houve muita coisa boa, que me motivou a continuar e pensar no próximo desafio. O Frank de 1999 sonhava. O Frank de 2019 é real, eu realizei os sonhos daquele guri. Minha trajetória como atleta foi sempre degrau por degrau, com muito trabalho, eu gosto dessa naturalidade, dessa consistência e regularidade, do dia a dia, do treino, da busca, das pequenas conquistas. O triathlon não é só o meu trabalho, é a minha vida. Os resultados são consequência e é isso que eu passo para os meus atletas. Até porque não dá para separar. O que eu digo pros meus atletas fazerem, o caminho por onde ir, é exatamente o que eu fiz e faço pra mim.

Desde quando e por que você treina com o Jim Vance?
Sempre fui muito inquieto e movido pelo próximo desafio. Jim gosta de números, métricas, análise, e isso me fascina. Ao mesmo tempo, é muito equilibrado e conservador em alguns pontos, trabalhando com a percepção de esforço e com a técnica, avaliando constantemente a recuperação do atleta, indo um pouco além da fisiologia. Me agrada a filosofia e a metodologia que ele prega, sem modismos.

Depois de vários bons resultados no Ironman Brasil com excelente corridas e provas você chegou ao 3º lugar no Ironman e conquistou a vaga para Kona. Estava nos seus planos? Como foi a prova?
Sem dúvida estava nos meus planos. Eu sempre busco um estado mental-físico entre estar focado e ao mesmo tempo relaxado. Pra mim esse é um grande diferencial. Talvez isso confunda as pessoas ou não revele que tenho minhas ambições, meus objetivos, meus sonhos… Na semana ao Ironman Brasil de 2018, no qual eu tinha sido 4º colocado e conquistado o meu melhor resultado, eu escrevi no meu quadro de parede que no ano seguinte eu faria a prova entre 8h06min e 8h10min, e não é que deu?! Uma semana antes eu escrevi pro meu treinador que meu objetivo era chegar entre os três primeiros, e também acertei! Eu já tinha feito um excelente ciclo para o Ironman Mar Del Plata, tão consistente quanto esse, e de lá pra cá eu apenas dei continuidade, dando mais ênfase na minha recuperação e cuidando para não me lesionar. Quando todos estavam treinando grandes volumes, entre fevereiro e março, eu ainda estava construindo e me adaptando.

O que contou mais, e quanto você precisou de uma mente forte para chegar ao objetivo?
Minha experiência de 20 anos no triathlon, minha maturidade como atleta, tem reflexos nessa área também, lógico. Mas eu também tenho a sorte e o privilégio de estar cercado por pessoas que me incentivam, empurram, levantam mesmo, dão segurança emocional, na família, entre os amigos, na minha equipe. Os treinadores que tive também me ensinaram muito sobre mente forte. Agora o que realmente fez a diferença foi fazer a prova com um propósito muito maior, foi correr pelo meu filho que irá nascer em outubro e pela minha esposa que estava lá me assistindo.

Qual a lição que fica?
Meus últimos resultados me ensinaram algo muito valioso, ou melhor, confirmaram na prática o que eu acreditava: o esforço coordenado, com paciência, consistência, humildade, dá resultado. Tive uma trajetória contínua, sem interrupções, evoluindo constante e regularmente dentro do ciclo esportivo. Meu primeiro Iron em Floripa foi pra 8h48, em 2012. Fui melhorando até 8h20. E este ano baixei mais dez minutos. Eu sabia que um dia a minha hora ía chegar – e o Iron Brasil me ensinou a acreditar e a confiar ainda mais no trabalho sério, no empenho, na perseverança, na resiliência diante dos desafios que vão surgindo e que existem pra deixar a gente ainda melhor e também o resultado mais saboroso. Por dez anos, como treinador, eu conhecia a prova por fora, apenas com a bagagem das provas curtas ou médio longas. Em oito participações só em Floripa, eu aprendi muito da prova, agora por dentro, e isso foi e é muito importante pra minha atuação como treinador. “

Como foi o planejamento para Kona e seus objetivos?
Aprimorei detalhes. Queria me sentir 100% pronto e preparado para esse grande momento da minha vida.  Quero olhar para trás sem arrependimentos, sabendo que entreguei o meu melhor durante a preparação. Investi um pouco mais no ciclismo, que é onde pode fazer alguma diferença e onde tenho mais amplitude para evoluir.

Qual seria a prova ideal para você em Kona. Até onde pode chegar? Já reformulou seus sonhos?
Agora eu quero me concentrar na preparação e em curtir cada etapa desse processo, aprendendo e evoluindo com a prática. Sei que Kona depende de muitas variáveis e principalmente em se adaptar e reagir bem ao calor. Acredito que nesse ponto eu tenho uma melhor resposta, principalmente se comparar com o frio. Mas chegar entre os 10 já seria um grande sonho ou buscar o melhor resultado de um brasileiro.

Agora que chegou em Kona, o que está sentindo?
Estou que nem o alpinista que chega no topo do Everest e tem que descer… peraí! Deixa eu aproveitar a vista! Estou curtindo o melhor momento da minha vida, que é estar aqui, ter conquistado a vaga para o Mundial que foi um sonho dos últimos dez anos, e me tornar pai! O lugar é muito lindo, mas continuo respeitando muito, pois as condições mudam a cada dia, e sempre pra pior! Então, muito respeito! Sigo treinando e tentando me ambientar. Penso que o ponto mais importante pra mim é me adaptar com o calor nesse curto período. Isso é o principal! O resto é estar pronto para qualquer surpresa do dia, com o vento. Agora o calor dificilmente vai mudar, pois sabemos que vai estar quente.

Redação

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