Um dos maiores desafios do treinador é equilibrar as adaptações a ponto de não sacrificar demasiadamente a influência glicolítica sobre a potência
Por Roger de Moraes
A análise das variações do lactato sanguíneo em atletas representou um dos mais importantes legados do grupo da Universidade de Cologne na Alemanha para o treinamento de endurance. Na década de 80, pesquisadores como Hollmann, Mader e Heck, aprimoraram os conceitos de limiar do lactato (LT2) e da máxima intensidade que poderia ser sustentada quando a produção de lactato equivaleria exatamente à máxima capacidade de sua remoção (maxLass).
Um conceito especialmente negligenciado fora da Alemanha foi a máxima taxa de formação de lactato (VLamax) considerada equivocadamente inútil para o rendimento aeróbico. Ainda que este parâmetro represente a capacidade anaeróbica glicolítica do atleta e estime seu percentual de fibras do tipo II, representa relevante informação para determinação dos caminhos dos blocos de periodização do atleta.
Como aqueles que possuem alto VLamax costumam apresentar baixo LT2, e apesar da exuberante potência muscular, fadigam precocemente no exercício prolongado, é crítico compreender que a modulação das cargas de treinamento é capaz de induzir fenótipo de fibras do tipo I (alta densidade de mitocôndrias e transportadores de glicose e reduzida atividade da ATPase) e modificar a cinética de lactato no sangue.
Se as sessões longas em ritmo baixo a moderado ampliam a capacidade mitocondrial de utilização de lactato por parte das fibras do tipo I, aquelas igualmente longas e intervaladas com esforço ainda submáximo embora em maior intensidade, modificam bioquimicamente as fibras do tipo II a ponto das mesmas se comportarem como fibras do tipo I. Tal adaptação eleva o limiar do lactato e amplia o percentual de utilização do VO2 máximo, entretanto reduz o VLamax e compromete a potência.
Um dos maiores desafios do treinador é equilibrar as adaptações a ponto de não sacrificar demasiadamente a influência glicolítica sobre a potência e ao mesmo tempo ampliar a capacidade de sustentar contrações musculares em movimentos cíclicos prolongados. Tal situação também é influenciada pelas características individuais do atleta que pode apresentar maior percentual de fibras I ou II e/ou peculiaridades na sinalização e transcrição gênica.
Roger de Moraes – @demoraesroger
Ex-triatleta Profissional, Professor de Fisiologia Geral
Doutor em Ciências com Pós-Doutorado no Laboratório de Investigação Cardiovascular do Instituto Oswaldo Cruz – Fundação Oswaldo Cruz