Em um artigo publicado há algum tempo falamos de como podemos avaliar se estamos ou não no caminho certo em relação ao planejamento para um Ironman. Dando prosseguimento e aprofundando mais esse assunto, falaremos sobre dois aspectos muito comuns para que você não cometa alguns erros. Durante o processo de treinamento para uma prova, especialmente uma prova como o Ironman, devemos estar atentos aos extremos do treinamento, ou seja, precisamos analisar se estamos indo além ou aquém do que podemos e necessitamos. Chamamos esses dois extremos de overtraining (excesso de treino) e undertraining (falta de treinamento ou treinamento insuficiente).
Começando pelo mais frequente que é o overtraining:
– Na maior parte das vezes vem da combinação de um grande volume de treinamento com uma alta carga de intensidade, o que gera um enorme desgaste em seu sistema imunológico e uma grande dificuldade de recuperação. A soma desses dois fatores pode ser crucial para uma lesão ou para uma doença, portanto cuidado com os treinos longos em grupo, pois estes tendem a ser mais fortes do que você deveria fazer em função da competitividade natural do ser humano.
Um outro ponto que pode desencadear um quadro de overtraining é o desequilíbrio no balanço hormonal. Esse desequilíbrio normalmente acontece devido a alguns aspectos como treinos muito longos sem as compensações adequadas que tendem a “inundar” o corpo com cortisol (hormônio do estresse) e trazer alguns efeitos nocivos como aumento da pressão arterial e do açúcar no sangue, catabolismo muscular e supressão do sistema imune. Fatores extra treinos também devem ser levados em consideração como estresse no trabalho, problemas familiares, poucas horas de sono e alimentação inadequada. Tudo isso tem um impacto hormonal muito grande em seu corpo e se não tivermos atenção para fazer as devidas correções, podemos estar jogando todo nosso treinamento por água a baixo!
Na fase de treinos específicos para o Ironman, onde fatalmente os volumes são grandes, indico aos atletas, principalmente os iniciantes que procurem seguir durante os treinos longos de corrida um protocolo que chamo de “run/walk” onde peço aos atletas para que corram entre 8 e 9 minutos e caminhem de 1 a 2 minutos, minimizando assim o impacto em suas articulações e reduzindo seus batimentos cardíacos. Outra dica é fracionar os treinos de natação em séries curtas para a manutenção da técnica e do ritmo. Essas condutas ajudam os atletas a cumprir sua rotina de treinos sem tanto sacrifício e reduzem consideravelmente a possibilidade de um overtraining.
Menos frequente, mas igualmente perigoso. Vamos falar sobre o undertraining:
– Na grande maioria das vezes a grande vilã para que se estabeleça um quadro de undertraining é a falta de consistência nos treinamentos. Esse problema pode ocorrer por vários motivos desde a falta de organização na rotina do atleta, que acarreta em falta de tempo para treinar até treinos muito intensos, visando “bater recordes”, o que faz com que o atleta fique extremamente fadigado e necessite de alguns dias de descanso total para se recuperar, quebrando a seqüência de treinamento.
Outra coisa importante é o atleta procurar desenvolver as valências físicas necessárias (velocidade, força, habilidades motoras, tolerância ao lactato e endurance) durante, pelo menos os 6 meses que antecedem a prova, pois o desenvolvimento de cada uma dessas valências leva um certo tempo e se o atleta deixar muito para em cima da hora, acabará não tendo tempo suficiente. Em se tratando desse aspecto, procuro orientar os atletas a usarem a “Periodização Inversa” (que já tratamos em artigos anteriores) e dividirem seu planejamento em blocos enfatizando em cada um, uma valência distinta.
Precisamos ainda estar atentos ao período que chamamos de “taper” ou polimento, pois é bem comum vermos atletas começando a diminuir o volume de treino muito cedo, cerca de um mês antes da prova e focando apenas na intensidade, na tentativa de manter seu nível de condicionamento e ganhar velocidade. Dessa forma, no dia da prova, vejo atletas rápidos, porém pouco resistentes que acabam sucumbindo após as primeiras horas competindo. O mais coerente seria reduzir exatamente a intensidade primeiro (pois a velocidade já deveria ter sido adquirida nas primeiras fases do processo de treinamento), diminuindo assim o nível de fadiga e deixar uma carga de volume maior até 14/10 dias antes da prova, para manter um bom grau de resistência, já que é o que a competição mais exige.
Por fim, vale lembrar que, assim como em qualquer esfera da vida, no treinamento para o Ironman, não podemos ser 8 nem 80, devemos sim, buscar o equilíbrio!
Rodrigo Tosta – ironguides coach, Rio
rodrigo.tosta@ironguides.net