Treine leve também, sem medo!

Treinar com pequenos volumes não significa treinar pouco e muito menos estar despreparado fisicamente

Por Rodrigo Tosta

É muito comum eu receber feedbacks dos atletas dizendo que seus treinos estão muito curtos, que gostariam de treinar mais ou que acabaram fazendo o treino regenerativo da semana acima da intensidade proposta.

O primeiro caso acontece, principalmente porque a grande maioria dos atletas ainda pensa dentro daquele antigo slogan, “quanto mais, melhor!” A evolução dos processos de treinamento e a vivência prática que temos hoje, nos mostra que é extremamente importante ter qualidade nas sessões de treino e que a recuperação de cada uma dessas sessões é de fundamental importância para a sessão seguinte.

Não que os treinos longos não tenham seu valor, mas precisamos deixá-los para os momentos certos dentro dos períodos específicos de treinamento, para não causarmos estresses desnecessários ao corpo, obrigando-nos a aumentar os períodos de recuperação, quebrando a consistência, fragilizando nosso sistema imunológico e prejudicando, muitas vezes, a percepção de aspectos técnicos devido à alta carga de trabalho.

Treinar com pequenos volumes não significa treinar pouco e muito menos estar despreparado fisicamente, contando, logicamente, que seu treino esteja bem planejado e estruturado. Treino curto pode sim ser sinônimo de qualidade e boa preparação, mesmo que seu objetivo seja competir em provas longas. Valências como velocidade, força e habilidades motoras devem ser desenvolvidas ao longo do processo de treinamento e para isso é necessário que os volumes sejam reduzidos, já que, normalmente, nesses tipos de treino, as intensidades serão maiores.

Aposte em treinos mais curtos, com foco em velocidade, força e habilidades motoras e deixe o volume para mais perto das provas longas (6 a 8 semanas) e não fique preocupado com sua resistência, treinando com consistência você irá adquiri-la, de uma maneira ou de outra!

SEGUNDO CASO
Agora vamos explorar o segundo caso citado no título que vem de encontro, basicamente, a dois aspectos: primeiro a crença de que treinos com intensidades baixas não trazem benefícios e segundo a competitividade que, muitas vezes, existe quando saímos para treinar em grupo. Ouço muitos atletas dizerem: “Pra treinar leve eu prefiro ficar em casa!” Esse tipo de pensamento é extremamente prejudicial por vários motivos. Vamos a eles:

– Os treinos leves são também chamados de regenerativos e são importantes exatamente porque ajudam o corpo a se recuperar das grandes exigências dos treinos intensos. Esses treinos têm a função de fazer uma espécie de reparo muscular, das fibras e do sistema cardiovascular, pois ativa a circulação e leva oxigênio para os grupos musculares auxiliando também na remoção de resíduos metabólicos produzidos durante exercícios de alta intensidade.

– Ficar sem treinar, “quebra” a consistência e a rotina, além de muitas vezes, sermos obrigados, por imprevistos do cotidiano, como compromissos profissionais e/ou familiares, doença ou mesmo uma viagem a ficar sem treinar e aí lá se vão mais uns dias de inatividade, o que pode acarretar em perda de condicionamento.

– É também treinando em intensidades mais baixas que aperfeiçoamos nosso sistema de utilização dos ácidos graxos (gorduras) como fonte de energia. Isso cria uma base para suportarmos as maiores intensidades e tornarmos nosso “motor” menos dependente dos carboidratos, o que faz em longo prazo, sermos mais rápidos em intensidades menores. Uma passagem muito famosa, que comprova isso, foi um período de aproximadamente um ano que o Hexacampeão do Ironman do Havaí e lenda do nosso esporte, Mark Allen, passou fazendo um treino de corrida de dez milhas, onde seu batimento cardíaco não podia passar de 155 bpm. No início, ele percorria cada milha por volta de oito minutos e quinze segundos (o que significa cerca de cinco minutos e dez por quilômetro ou onze e meio quilômetros por hora), mas no final desse período esse tempo tinha baixado para cerca de cinco minutos e vinte segundos por milha (três minutos e vinte por quilômetro ou dezoito quilômetros por hora) mantendo a mesma frequência cardíaca.

– Por fim, e acredito que esse seja o motivo mais importante pelo qual não devemos abrir mão dos treinos leves, seja para ficar em casa ou para trocá-los por um treino mais forte: nesses treinos temos a oportunidade de treinar nossas habilidades motoras. Por não estarmos preocupados com o ritmo ou com determinada intensidade, podemos incluir séries para o aprimoramento de nossa técnica tanto na natação, quanto no ciclismo e na corrida. Assim, aos poucos, conseguiremos o que chamamos de economia de movimento, gerando um menor gasto energético para um gesto motor mais refinado. Lembre-se que técnica só é válida quando conseguimos sustentá-la sob pressão! E apenas com muito treino esses movimentos ficarão naturais, espontâneos.

O outro fator que, invariavelmente, prejudica os treinos leves, como citado anteriormente, são os treinos em grupo. Nesses treinos, normalmente queremos acompanhar os amigos, que podem estar num ritmo mais elevado do que precisamos para aquela sessão ou acabamos “caindo na pilha” e acelerando mais do que devemos, prejudicando todo o planejamento daquele dia.

Portanto, quando estiver agendado em sua planilha um treino leve, não mude o planejado, pois fazer esse tipo de treino adequadamente te dará condição de treinar realmente forte quando for exigido. Aproveite essas sessões para aperfeiçoar sua técnica e mostrar a seus amigos que você é disciplinado com seu treinamento em busca de seus objetivos.

Rodrigo Tosta é técnico e diretor da RT Performance. @rt.performance e @rodrigotosta

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