Cresci atleta. Minha primeira competição federada foi aos oito anos de idade. Passei a infância e adolescência ouvindo que tinha que passar os meus próprios limites todos os dias. E acreditei nisso. Todos os dias tinha que passar a barreira da dor para a da agonia. Não apenas atletas, mas muitas pessoas vivem essa máxima em suas vidas, acreditando que superar limites é ultrapassá-los. E eu, por muitos anos acreditei nela também. Frequentemente me via em conflito, pois inerentemente entendia que alguma coisa não cabia. Minhas experiências e vivências fora do esporte competitivo me levavam a acreditar que existia, na impermanência da vida e das coisas, um certo poder-ser-em-harmonia, tentando lidar com as situações que se apresentavam na vida sem o sofrimento de sempre ter que passar dos limites.
Levou-me muitos anos para compreender uma singela e grande diferença, mas complexa em nossa constituição enquanto seres humanos. A diferença entre passar seus limites e expandi-los.
Ao ultrapassar nossos limites nos esvaziamos, nos esprememos para alcançar metas, tempos, colocações, promoções. Sofremos com pressões, nos lesionamos, física e emocionalmente, somos atropelados ou nos atropelamos. Vivemos sempre no susto.
Diferente de quando expandimos nossos limites. Aí também há sofrimento, pois o medo está presente. Medo de sair da zona de conforto e de inovar. Entretanto, ao expandirmos nossos limites nos enchemos, preenchemos espaços. Criamos novos recursos e estruturas para uma transição de nível, expandindo nossas bordas de atuação no mundo. “Completamos” mais lugares.
Fazendo um paralelo concreto com o corpo no esporte, ao ultrapassarmos nossos limites lidamos com cargas maiores do que aquelas com as quais o corpo estaria preparado. Ele aguenta por um tempo, ultrapassa a barreira desejada. Um corredor iniciante treina durante um ano e corre uma maratona. Durante os treinos ou alguns meses após a maratona ele percebe os custos da alta exigência em um espaço curto de tempo. Lesões começam a aparecer em seu corpo, as estruturas não estavam preparadas para a carga. Alguns corpos mais bem preparados aguentam por mais tempo sem se lesionar, mas uma hora ou outra, quando se ultrapassa os limites, o corpo quebra. Quando existe uma preocupação estrutural e a pessoa consegue expandir os limites do corpo aos poucos, ela também conseguirá alcançar o objetivo final, talvez leve mais tempo, talvez perceba que no meio do caminho seu objetivo tenha mudado, ou nem era seu para começo de conversa, mas há tempo para a formação do movimento e do corpo para uma carga alta.
Assim somos na vida, colocamo-nos nos fluxos correntes da cotidianidade, na correria desenfreada do “ter que fazer”, “ter que ser”, e nos determinamos por padrões que são, muitas das vezes, muito maiores do que nossas estruturas possam suportar. Uma hora ou outra quebramos. Super exigidos os corpos sofrem, sofremos com ansiedades, depressões, culpa, cobranças e tantas outras formas de sofrimento.
Ao contrário, quando nos preenchemos para suportar essas cargas, quando aprendemos a nos expandir para dar conta dos desafios e não nos esvaziarmos nos extremos, encontramos significado em nossas ações, nossos objetivos e metas têm sentido e nos encontramos inseridos no mundo, como parte de um contexto. É aquilo que chamamos empoderamento.
A psicoterapia é uma das possibilidades de desenho desta apropriação de si mesmo e expansão de limites.
Fazendo um balanço de seu momento de vida: você acredita que superar os limites é ultrapassá-los ou expandi-los?
Daniela de Oliveira é psicóloga esportiva e ex-nadadora profissional
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